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Brigadistas encontram animais mortos na maior queimada em décadas no Pantanal

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Queimada no Pantanal, em Poconé, Mato Grosso — Foto: Rogério Florentino/AFP”Você vê o animal todo encolhido, dá muita dó. Parece cena de filme”, disse o brigadista Heuler Hernany

As queimadas no Pantanal reservam aos brigadistas um trabalho árduo de combate às chamas. Washington Rojas, de 24 anos, e Heuler Hernany, de 25 anos, sabem bem disso. Chefes de esquadrão do Sistema Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo), no Mato Grosso do Sul, eles se dedicam à preservação da natureza.

O Pantanal sofre com a maior temporada de queimadas em décadas. As chamas já consumiram 1,5 milhão de hectares, sendo 910 mil em Mato Grosso do Sul e o restante em Mato Grosso.

Uma reportagem de Camilla Veras Mota para a BBC Brasil mostrou o importante trabalho dos 90 brigadistas do Prevfogo, personagens essenciais nessa história de luta pela preservação do bioma. Em entrevista ao jornal, o supervisor de brigadas do Prevfogo Bruno Águeda revelou que nem mesmo a chuva que caiu sobre a cidade de Corumbá foi capaz de dar fim ao fogo. Isso porque a água não foi suficiente para encharcar o solo. A aproximação do frio também não é vista com bons olhos, porque o inverno na região costuma ser seco.

Determinados, os brigadistas começam a trabalhar às 8 horas e não têm hora para acabar. “Quando a gente vê que dá pra vencer o fogo, a gente continua. Já cheguei a virar noite”, afirmou Rojas.

Das 10h às 14h, o fogo se mostra em sua pior fase. Ao contrário do período noturno, quando costuma ser mais fácil controlar as queimadas. O cenário, porém, torna-se mais perigoso à noite, já que os brigadistas precisam enfrentar a mata fechada em meio à escuridão.

Há também as dificuldades emocionais. Lidar com a destruição causada pelo fogo é doloroso. Para Hernany, ver animais fugindo ou carbonizados foram as cenas mais impressionantes que viu durante o trabalho. Ele já encontrou um tatu e um filhote de macaco mortos. Rojas, por sua vez, já presenciou cinco jacarés queimados de uma só vez. “Você vê o animal todo encolhido, dá muita dó. Parece cena de filme”, disse Hernany.

Os animais mais lentos são as principais vítimas das queimadas. No entanto, às vezes as chamas aparecem inesperadamente e qualquer animal pode ser morto. Denominado “fogo subterrâneo” ou “fogo de turfa”, esse tipo de chama aparece “do nada”.

Isso se deve às secas e cheias, que criam camadas de matéria orgânica no solo. Segundo Águeda, forma-se uma espécie de sanduíche, com uma camada de terra, outra de vegetação, mais uma de terra, e assim por diante. Se o fogo atinge uma das camadas mais profundas, ele se espalha nas profundidades até emergir para a vegetação mais seca através de alguma fissura.

O fogo subterrâneo, no entanto, não é o único desafio dos brigadistas, que também lutam contra o vento, que muda subitamente e carrega as chamas para outra direção. Em alguns casos, logo após a retirada de uma faixa da vegetação para frear o fogo, o vento muda. “Às vezes o brigadista passa o dia inteiro batendo enxada e o vento leva o fogo para outro lado”, afirmou o supervisor de brigadas.

“A gente pode ter feito tudo, mas às vezes o vento muda e joga uma fagulha a 100 metros. A coisa que mais choca é a sensação de impotência”, completou o tenente-coronel Rodrigo Bueno, do Corpo de Bombeiros do Mato Grosso do Sul, instituição que também exerce papel essencial no combate às queimadas no Pantanal.

O último relatório sobre uma força-tarefa de combate às queimadas revelou a participação de 81 bombeiros do Mato Grosso do Sul e 42 do Mato Grosso, que atuaram em três bases: em Poconé/Sesc Pantanal (MT), em Corumbá (MS) e na terra indígena dos Kadwéus (MS).

Além das saídas diárias a partir das bases, equipes são enviadas a missões em áreas mais afastadas. Tenente Bueno é um membros dessas equipes. Voluntário para passar 10 dias na base do Sesc Pantanal, ele costuma trabalhar em Maracaju (MS). Em uma de suas missões, foi enviado à área da Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) do Sesc Pantanal para impedir que o fogo atingisse a casa do único morador do local: seu Dito Verde. O homem, considerado “uma lenta do Pantanal”, vive em “uma casinha de barro, com telhado de sapê, toda feita por ele.”

Bombeiro há 10 anos, Bueno afirmou à BBC Brasil que nunca viu uma operação tão grande de combate aos incêndios. E isso tem razão de ser. Segundo o presidente do Instituto Homem Pantaneiro, coronel Ângelo Rabelo, as queimadas no Pantanal têm piorado ano após ano.

Quando iniciou os trabalhos na região, na década de 80, o coronel se deparou com “um dos momentos mais violentos da história do Pantanal”, com muitos animais sendo traficados e mortos. Atualmente, a maior preocupação é o fogo, que ameaça a existência de quase 4,7 mil espécies de plantas e animais.

Fonte: Anda